A estética em quarentena
- Denise Flores

- 6 de jul. de 2020
- 3 min de leitura
Logo nos primeiros dias de recolhimento social, vi alguns post’s que falavam mais ou menos assim: “se você está sem se depilar porque ninguém está vendo, você precisa mesmo se depilar?”.
Junte a isto a falsa ilusão de uma pressão pela abertura dos salões de beleza, digo falsa porque se por um lado alega-se demanda para isto, por outro, na primeira tentativa de reabertura, os espaços tiveram pouca procura por horários. Por último, mas não menos importante, além da onda de cortar o próprio cabelo, temos muitas mulheres raspando suas cabeças, dá para saber que são muitas porque o "fenômeno" já virou matéria nas redes.
Esta situação que estamos vivendo, este confinamento social, nos coloca de encontro com nossas luzes e sombras, e também, com nossos corpos e as decisões sobre eles.
O olhar, o abraço e o toque do outro estão fazendo falta, mas suas ausências também podem fazer parte de um processo libertador.
Sem o olhar do colega de trabalho que não sabe fazer um elogio decente “o corte ficou legal, mas prefiro cabelo grande”. Ou do olhar torto da vizinha de manicure que acha que mulher tem que usar vermelho. Sem precisar justificar que colocou short por causa do calor insuportável, apesar de não ter raspados as pernas. Estamos muito mais livres.
Livres de pressão social, de influências de moda, de palpites que não foram solicitados. Livres para nos tocarmos e sabermos o que realmente nos agrada e o que incomoda. Livres para experimentar. Para nos olharmos no espelho e nos vermos como somos, livres de qualquer papel social. Sem roupa de trabalho, sem roupa de sair. Sem roupas exigidas por convenções sociais.
Livres para entendermos do que de fato sentimos falta e o que fazemos porque nos foi ensinado a fazer.
Nestes últimos meses de confinamento, raspei as pernas porque estava incomodada e pintei as unhas para acrescentar cor a vida. Este ano não cortei o cabelo e agora quero fazer a transição para diminuir ou eliminar o uso de shampoo. Uso pinça para tirar pêlos no queixo porque senão cutuco o tempo todo. As sobrancelhas estão crescendo livres e estou amando a volta ao “formato original de fábrica”. Assim que possível, quero correr para o podólogo.
Fico feliz de encontrar este equilíbrio entre o que quero fazer e o que não me faz falta. Muitas pessoas estão quebrando a quarenta e burlando regras para estarem sempre com as unhas feitas, o padrão estético não pode estar acima da vida.
Há alguns anos eu não conseguia ficar sem fazer as unhas, produzia o dia todo, e ia ao shopping a noite para fazer as unhas. Estava em uma fase que não gostava do que via no espelho, então no mínimo as unhas precisavam estar intocáveis.
A medida que fui amadurecendo, ficando mais forte, entendi que tudo bem chegar para trabalhar sem fazer unhas e sobrancelhas, porque o trabalho estava em dia, o sono estava em dia, e eu estava bem.
É normal termos aqueles momentos em que não estamos bem, não nos achamos tão bonitas, etc. Mas não é normal acharmos que se não seguirmos todo um protocolo de padrão estético não seremos aceitas, admiradas ou amadas.
Desejo que todes aproveitem este período de recolhimento social para se conhecerem melhor, entenderem seus corpos e desejos. Se libertarem de padrões. Para que quando tudo isso passar, possamos nos reencontrar com elogios sinceros, sorrisos leves e olhares mais generosos a diversidade. Que a verdadeira beleza, aquela que cada um resolve ostentar, seja celebrada a cada encontro.






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