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Eu, mulher

  • Foto do escritor: Denise Flores
    Denise Flores
  • 9 de mar. de 2018
  • 4 min de leitura

8 de março de 2018, dia internacional da mulher, fiz uma programação bem específica, assistiria duas palestras e depois iria a marcha unificada. Apareceu um freela. Mudança de planos. O dia foi de muito trabalho.

Mas antes que o dia acabe, parei para colocar no “papel” o texto que fui escrevendo na cabeça ao longo do dia.

Quando me tornei mulher? O que significa ser mulher?

Nasci mulher, mas não tenho muitas lembranças do que isso significou quando era criança. Gostava de brincar de boneca, de jogos de tabuleiro, tive uma máquina de escrever de brinquedo, usava umas roupas “de menina”. Mas também tive walk machine e um mini-bugue. Posso considerar que foi uma infância com boas opções.

Talvez no colégio? Um pouco, quem sabe. Certamente foi um ambiente onde aprendi sobre resistência e a defender meu ponto de vista. Onze anos estudando em colégio católico, uma educação bem machista, mas sobrevivi. Lembro de ir a uma reunião com o grêmio, e uma pessoa estranhar que eu era a presidente do grêmio. “Uma mulher?”, ela perguntou admirada, apesar de lembrar da cena, naquela época isto não teve um impacto tão grande.

As pessoas as vezes colocam a primeira menstruação como um marco de que “a menina se tornou mulher”. Menstruei com dez anos, chorei litros, não entendi porque meus pais me deram parabéns, fiquei ansiosa com a história do absorvente e escola e meninos. Além do detalhe que no dia seguinte precisava me apresentar com colant branco, meia branca, saia branca.

Quando perdi a virgindade? Não. Foi legal, foi com minha grande paixão da adolescência. Mas a sequência também foi de choro e sentimentos confusos. Não foi exatamente uma grande transformação.

A verdade é que é difícil escolher um momento e dizer “ali me tornei mulher”, mas não é difícil reconhecer os momentos em que me identifiquei mulher.

Os primeiros assédios, lembro de dois, mas ainda era mais menina que mulher, então demorei para entender que foram assédios. E isto me ensina a importância de lutar contra o machismo e a ensinar nossas meninas, desde cedo, o que é assédio, e como podem se defender (ou pedir ajuda).

Quando entendi que estupro é muito mais presente do que qualquer um gostaria. Acontece uma campanha, as mulheres tomam coragem, contam suas histórias, e eu comecei a entender quantas mulheres próximas a mim já sofreram essa violência. Isto me deixou ainda mais alerta.

Mulher se identifica mulher pelo medo de andar sozinha na rua.

Quando eu e minha amiga, em um show, defendemos uma moça (que não conhecemos), ela estava prestes a ser seriamente assediada por um homem.

Quando fui para a primeira caminhada só de mulheres, e entendi a força do grito e da união.

Todas as vezes que fico sabendo de um caso de violência de gênero. Quando entendi a importância da palavra “feminicídio”, neste dia, chorei.

No primeiro nódulo na mama. Em cada mamografia e ultrassom. Em cada preventivo.

Quando gritaram comigo, só porque sou mulher. Na verdade só porque quem estava gritando é machista. Mas também sofri assédio moral de mulher, e tudo isso é tão confuso, que dói.

Quando deduzem que sou assistente só porque o parceiro de trabalho é um homem.

Todas as vezes que tive que explicar que meu amigo é meu amigo, e que posso ter um amigo homem e sermos bons amigos, e que não preciso namorar ele.

Todas as vezes que fiquei sem graça com as perguntas sobre casamento e filhos, e com as “condenações” de que vou ficar sozinha porque ainda não casei e todas as minhas conquistas pessoais foram ignoradas.

Quando, enfim, entendi a importância da descriminalização do aborto. Essa demorei um pouco para aprender, mas hoje, carrego a bandeira.

Me reconheci mulher na morte do meu pai. Foi uma briga para carregar o caixão. E depois da sua morte, seguimos, quatro mulheres, enfrentando o mundo, resolvendo problemas. Minha mãe se fez forte, nos reconhecemos em sua força. Desabrochamos um pouco mais. Hoje, lembramos com carinho que meu pai sempre mandava flores no dia das mulheres (e esta é a lembrança mais querida que tenho deste dia).

Aprendi que existem mulheres que por um acidente do destino nasceram com um pênis. Acontece, e ainda sim, são mulheres incríveis. E foi outro dia mesmo que aprendi que mulher também pode ser drag queen (mulher pode ser o que quiser).

Este ano fui a praia, fizemos topless, e tiramos um dia para fazer fotos. Mulheres incríveis, uma vibe boa de empoderamento.

Nos grupos exclusivos para mulheres, mulheres que nem sempre se conhecem, lutando e praticando a sororidade.

A medida que fui conhecendo mulheres incríveis. Com personalidades fortíssimas. E fui me identificando.

Ao conhecer Frida Kahlo e Simone de Beauvoir.

Quando abro o Facebook e vejo tantas mulheres incríveis no ato unificado. Maria, Cris, Nara...Eu conheço estas mulheres, e isto é tão legal.

Ao ver Cris, Fefe, Tati, Ana, Priscila, Pri, Marina, Mariana e tantas mulheres se tornarem mães. A maternidade precisa ser uma escolha. Precisa ser acolhida com amor. Nem todo mulher nasceu para ser mãe, quem não é mãe não é menos mulher.

Nos dois últimos curtas produzidos com a Ana, diretora e mulher incrível. Com Lira e Andréia, mulheres fantásticas, interpretando protagonistas fortes. A oportunidade de levar temas femininos (e feministas) para as telas e debater é um privilégio.

A verdade é que eu vivo uma crise existencial sobre a mulher que eu sou ou posso ser. Tento entender o potencial que existe em mim, e como faço para aproveitá-lo.

Mas já dei passos importantes, aprendi a lutar como uma mulher. Entendi que posso ser e sonhar com o que eu quiser. Que ser frágil e romântica não me faz menos mulher. Porque quando preciso, sou incrivelmente forte. Sou resiliente. Sou mulher.

Obs.: A foto é repetida. Mas adoro esta foto. E marquei a pele para nunca esquecer.

 
 
 

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